Bispos de Moçambique: “Há muita gente sem o mínimo de recursos para a sobrevivência”

Membros da Conferência Episcopal de Moçambique (CEM). Foto: CEM

“A situação da segurança em Moçambique, e em especial em Cabo Delgado e no Centro do país, constitui um dos focos das nossas preocupações e reflexões. É uma realidade amplamente partilhada nos meios de comunicação e nas redes sociais, embora nem sempre de forma objetiva e ética”, afirmam os Bispos Católicos de Moçambique no seu comunicado divulgado no domingo, 14 de novembro, e que publicamos na íntegra.

Comunicado da CEM às Comunidades Cristãs e às pessoas de boa vontade
1. Saudação

Às Comunidades Cristãs, aos sacerdotes, religiosos e religiosas e a todos os homens de boa vontade, paz e alegria em Cristo Rei do Universo e Príncipe da Paz. Reunidos em Mumemo, no Centro das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição, Marracuene, de 08 a 14 de Novembro, para a segunda sessão ordinária da Assembleia Plenária da Conferência Episcopal de Moçambique, deste ano de 2021, nós, os Bispos católicos, manifestamos a nossa presença espiritual e exprimimos a nossa comunhão e solidariedade convosco, particularmente neste período marcado por não poucas provações em vários âmbitos da nossa vida: político, social, económico e sanitário. Queremos, deste modo, partilhar convosco alguns frutos dos nossos trabalhos ao longo destes dias.

2. Sufrágio e homenagem à Sua Eminência Cardeal Dom Alexandre José Maria dos Santos

Com gratidão, lembramo-nos e rezamos em sufrágio das almas dos que passaram, em especial pelos membros da Conferência Episcopal. E, como não podia ser doutra maneira, quisemos particularmente render homenagem à pessoa e à obra de Sua Eminência Reverendíssima Cardeal Dom Alexandre José Maria dos Santos, recentemente falecido. Como acertada e pontualmente destacou o Santo Padre, o Papa Francisco, na sua mensagem de condolências, Dom Alexandre foi “um servidor incansável do Evangelho e da Igreja”. De facto, como primeiro sacerdote, bispo, cardeal nativo do nosso País e com uma ímpar solicitude pela educação dos moçambicanos, o Cardeal dos Santos combateu o bom combate, guardou a fé e deixou-nos um rico legado de digno operário da vinha do Senhor. Imploramos ao Senhor para que, depois de lhe ter dado o dom de uma longa missão na terra, o acolha nos seus braços misericordiosos e lhe conceda a plenitude da vida na eternidade.

3. Olhar sobre a situação sociopolítica e religiosa do país

A situação da segurança em Moçambique e em especial em Cabo Delgado e no Centro do país, constitui um dos focos das nossas preocupações e reflexões. É uma realidade amplamente partilhada nos meios de comunicação e nas redes sociais, embora nem sempre de forma objetiva e ética.

A presença das forças estrangeiras, ruandesas e da SDAC, faz esperar a melhoria da situação de segurança. Com efeito, há notícias de progresso na recuperação do espaço que estava nas mãos dos insurgentes, o que contribui para uma segurança relativa. Algumas pessoas regressam às próprias aldeias. Renovamos a nossa solidariedade para com a multidão de pessoas que ainda permanece nos campos de reassentamentos. Um dos grandes desafios do momento presente continua a ser a assistência humanitária às populações vítimas de violência e deslocadas. Há muita gente passando fome, sede, portanto, sem o mínimo de recursos para a sobrevivência. Outra prioridade é a urgência de organizar e investir no trabalho de reconstrução de infraestruturas condignas e habitações para as populações que voltam para as próprias aldeias.

4. Preocupação com a Juventude

Na sequência da nossa Declaração de Abril, através da qual manifestámos a nossa preocupação com a Juventude Moçambicana, nesta Assembleia, continuamos a colocar no centro das nossas reflexões a situação da juventude, o seu presente e o seu futuro. É de capital importância tomar a consciência de que, com efeito, os jovens constituem a grande parte de fiéis da nossa Igreja e da população moçambicana. E como bem fez notar o Papa Francisco, a juventude não é só o futuro, mas o presente de Moçambique que nos interpela. Impõe-se, por isso, uma reflexão abrangente e integral sobre a necessidade de um projeto de toda a Família Moçambicana sobre a juventude, um projeto capaz de ir ao encontro das suas legítimas inquietações e aspirações e de lhes dar oportunidades para realizarem seus sonhos de vida.

Ainda sobre a juventude, na esperança que sejam ultrapassados os constrangimentos ligados à crise da pandemia do Covid-19 e se volte à normalidade, foi apresentada a proposta de realização, na próxima Solenidade de Cristo Rei do Universo de 2022, da 2ª Jornada Nacional da Juventude, em Nampula. Por outro lado, a CEM recebeu o convite de Sua Eminência o Cardeal Patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, para a participação dos jovens e dos Bispos de Moçambique na Jornada Mundial da Juventude que terá lugar em Lisboa de 1 a 6 de Agosto de 2023. Por isso, convidamos toda a Igreja em Moçambique a preparar-se para aquele importante evento da Igreja.

5. Assembleia eletiva e departamentos

Esta Assembleia plenária elegeu o Conselho Permanente da CEM e os membros dos departamentos, tendo ficado assim constituído:

Presidente: D. Inácio Saúre, Arcebispo de Nampula

Vice-Presidente: D. João Carlos Hatoa Nunes, Bispo de Chimoio

Secretário Geral: D. António Juliasse Ferreira Sandramo, Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Maputo e Administrador Apostólico de Pemba.

Vogal da Província Eclesiástica de Nampula: D. Ernesto Maguengue

Vogal da Província Eclesiástica da Beira: D. Diamantino Guapo Antunes

Vogal da Província Eclesiástica de Maputo: D. Francisco Chimoio.

Ao fazer revisão da experiência de trabalhar em departamentos, apreciamos a caminhada feita neste último triénio como algo de positivo, precisando, contudo, de ser aprimorada e consolidada. Com esse intuito, decidiu-se manter a atual estrutura dos departamentos.

Os Bispos designados para cada um dos Departamentos são:

Departamento Social: D. Alberto Vera (Caritas Moçambique e Pastoral Penitenciária), D. António Juliasse (Justiça e Paz) e D. Atanásio Canira (CEMIRDE e Saúde).

Departamento Pastoral: D. Ernesto Maguengue (Educação e Família), D. Inácio Saúre (Juventude, apostolado dos leigos) e D. Hilário da Cruz Massinga (Liturgia)

Departamento da Missão e Diálogo: D. Lúcio Andrice Muandula (Pastoral bíblica), D. Diamantino Antunes (Evangelização e Catequese e Diálogo inter-religioso), D. João Carlos Hatoa Nunes (Comunicação), Adriano Langa (Cultura e Inculturação).

Departamento Vocacional: D. Cláudio Dalla Zuana (Pastoral Vocacional e Clero); D. Inácio Lucas Mwita (Seminários), D. Francisco Chimoio (Vida Consagrada).

7. Sinodalidade e IV Assembleia

Acolhemos com alegria a iniciativa pastoral do Santo Padre de convocar toda a Igreja para participar no Sínodo subordinado ao tema: Para uma Igreja Sinodal: Comunhão, participação e missão. Esta iniciativa acontece num momento em que estamos empenhados na realização da IV Assembleia Nacional de Pastoral, por isso, para caminharmos juntos com toda a Igreja, achamos por bem, de Setembro até finais deste ano, dar prioridade aos trabalhos relativos a este evento eclesial. Em Fevereiro, deveremos retomar e dar continuidade a caminhada da IV Assembleia, que já é uma expressão da sinodalidade. Deste modo, os trabalhos da IV Assembleia obedecerão o seguinte calendário: Até 30 de Agosto as Assembleias Diocesanas e até 30 de Outubro as Assembleias em Províncias Eclesiásticas.

8. Intervenção do Núncio Apostólico

O Senhor Núncio Apostólico em Moçambique, Sua Excelência Reverendíssima Dom Piergiorgio Bertoldi, partilhou com os bispos o tema sobre a sinodalidade no pensamento do Papa Francisco com base nos seus diversos documentos e intervenções. Depois da apresentação do tema, seguiu-se um momento de proveitoso diálogo, durante o qual nós, os bispos, manifestámos a nossa extrema preocupação com as grandes dificuldades que se prendem com o processo de obtenção de vistos para os missionários.

9. Seminários

Nesta sessão debruçámo-nos também sobre os vários aspetos dos nossos seminários, com especial destaque para os seguintes:

– Mudança da equipa formadora do Seminário de Santo Agostinho da Matola dos Padres Diocesanos para a Congregação dos Padres Espiritanos;

– Início do seminário Interdiocesano de São Carlos Lwanga de Nampula a partir do ano formativo de 2022.

– Evidenciamos a importância do seminário propedêutico como etapa de discernimento e aprofundamento vocacionais.

– A partilha do processo de transformação do Seminário Teológico de São Pio X em Instituto teológico afiliado à Universidade Urbaniana de Roma.

10. Catolicidade dos nossos centros educativos

Debruçámo-nos também sobre os desafios da educação católica no momento presente. No intuito e no esforço de responder à necessidade urgente de trabalhar para fortalecermos a nossa comunhão e constituirmos uma única voz no exercício da missão de evangelizar educando, foi apresentado o documento: “Centros de Educação Católica. Caminhando juntos”, preparado num itinerário de dois anos pelo Secretariado de Educação com a colaboração de uma equipa de educadores católicos selecionados e em diálogo com as Comissões Diocesanas de Educação. Reconhecendo que o documento vai preencher um vazio que se sentia de diretrizes sobre a identidade católica das nossas escolas e centros educativos, foi aprovado e assumido como instrumento de orientação na missão educativa em Moçambique.

Ainda neste âmbito, sentiu-se a necessidade de encontramos formas de constituir um único corpo que reúne todas as instituições e pessoas que se inspiram e se sentem vinculadas com a Igreja católica. O Secretariado Nacional de Educação ficou com o encargo de agilizar e levar a frente esse processo.

A terminarmos, queremos exortar a todos os fiéis a consolidar a sua fé e esperança no Senhor Jesus Cristo, Nosso Salvador, que sempre vem, através da escuta assídua da Palavra de Deus, frequência constante nos sacramentos e através do testemunho de vida cristã; na verdade, sabemos que a esperança não engana. Porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. (Rom 5,5); e às pessoas de boa vontade, queremos igualmente apelar a buscar sempre e perseverar na prática do bem.

Mumemo, 14 de Novembro de 2021

Dom Inácio Saúre, IMC, Arcebispo de Nampula e Presidente da CEM

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