
A compreensão do que significa “ser Igreja”, “ser casa de Deus” não é fácil, porque não se enquadra com a nossa razão humana.
Por Joaquim Gonçalves *
Para entendermos bem o que significa ser Igreja construída “com pedras vivas” (1Pd 2, 4-9) que tem Jesus como “pedra angular” é necessário procurarmos as respostas de Jesus perante a interpelação que lhe fizeram diversas vezes sobre o Reino que Ele vinha construir. Uma das respostas foi dada a Pilatos na hora do julgamento, quando lhe perguntou: “és tu o rei dos judeus”? E Jesus respondeu: “meu reino não é deste mundo”. Neste momento histórico da vida da igreja, o modo mais fácil para entendermos o que é ser igreja consiste em pensar sobre a vida em comunidade, em comunhão de vida, em partilha, com confiança mútua. Uma comunidade que pode ter como referência a família, a fraternidade e na frente a felicidade segura.
O Evangelho deste V Domingo de Páscoa (Jo 14, 1-12) é um pedacinho dos ensinamentos de Jesus aos Apóstolos depois da última ceia para explicar-lhes como Deus quer uma união profunda entre eles e com Ele, para que Deus habite na comunidade e no coração de cada um deles. Jesus despede-se garantindo que vai para a casa do Pai porque é aí que lhes reserva um lugar. As incertezas deles brotam da boca de Tomé: “Nós não sabemos para onde vais”! …
Aí vem a resposta de Jesus com toda a transparência: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim”. Jesus não explica o caminho, mas diz que Ele é o caminho, que é preciso ir com Ele e que só é possível ir com Ele se acreditarmos n’Ele de verdade, porque as obras que realiza não são d’Ele mas do Pai. Portanto, o “caminho” que Jesus percorreu e que os discípulos viram com clareza é o mesmo que os discípulos devem aceitar percorrer para tornar presente em continuidade o Reino de Deus para toda a humanidade. É neste âmbito de ensinamento que se inspira o convite do Papa para que sejamos uma “Igreja em saída”, saída de nós mesmos e saída para percorrermos o caminho em busca de ovelhas perdidas; uma igreja peregrina que cuida bem do caminho da fé verdadeira.
Na Igreja não pode faltar um rosto de credibilidade e visibilidade, modelado em todos os que se dizem cristãos e como tais vivem como discípulos e verdadeiros construtores de seu Reino. Nesse rosto não pode faltar o espiritual e o material sempre unidos, a fé e obras correspondentes. O mistério da fé não está presente apenas quando celebramos a Eucaristia, mas na vida real de cada um que comunga o Corpo do Senhor e vive como um templo no qual Ele mora. A simples mudança ou adesão a novas ideias não é conversão que é opção por outro caminho e outro pacote de verdades alicerçadas na Palavra de Deus: “O céu e a terra passarão, mas as minhas Palavras não passarão”.
“Na casa do Pai há muitas moradas”, diz Jesus para ajudar os Apóstolos a superar as dúvidas e iniciar o “caminho”. Há muitos lugares e Jesus promete reservar lugar seguro para aqueles que o seguirem. Seguir o caminho de Jesus implica também inevitavelmente estar disposto a aceitar a rejeição por parte dos descrentes e dominadores e o desprezo até à morte. Os mártires chegaram ao mais alto grau do “caminho de Jesus” dando a vida por amor total, deixando na história um sinal visível e credível da presença de Deus na própria vida. Jesus pede aos discípulos que superem as incertezas, acreditando nas suas obras: “acreditai-me; Eu estou no Pai e o Pai está em Mim; acreditai pelo menos nas minhas obras”. “Quem acredita em mim fará também as obras que Eu faço e fará ainda obras maiores”.
Que maravilha! Chegarmos a uma união tão profunda com Deus, a ponto de as obras que fizermos em nome d’Ele terem maiores consequências. Deus não quer ninguém com obras começadas e paralisadas.
* Padre Joaquim Gonçalves, IMC, é missionário em Fátima, Portugal.