Cardeal Barreto: “A Assembleia Eclesial deve ser uma caixa de ressonância para todas as angustias do Continente”

24 de novembro de 2021

Por Luis Miguel Modino *

Uma coletiva de imprensa onde foram ouvidos os clamores da América Latina. É assim que poderíamos considerar o momento vivido nesta terça-feira em que mais uma vez, como acontece todos os dias da Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe, representantes de diferentes realidades relataram o que está presente em sua vida cotidiana.

Estes são os gritos do povo negro, como disse a Irmã Maria Suyapa, que denunciou a marginalização das mulheres negras, que não são reconhecidas pelo que oferecem à Igreja e à sociedade. A exclusão, segundo a representante da Pastoral afro-latino-americana na Assembleia Eclesial, é algo que dói, mas ela diz não perder a esperança, que vem da conversão pastoral que a Igreja nos pede, para que “aqueles de nós que estão na periferia possam ser incluídos, especialmente os negros, as mulheres”. A religiosa diz que espera que um dia nossa Igreja Mãe conte conosco, porque temos muito a contribuir para a Igreja.

Os gritos da Amazônia foram veiculados pelo Cardeal Pedro Barreto, que expressou sua alegria em participar da Assembleia. O presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), denunciou as consequências da pandemia na Amazônia, especialmente no Brasil, onde o povo Yanomami, no estado de Roraima, está sofrendo as consequências do abandono, a ponto de ser deixado a ponto de morrer. Diante disto, insistiu o Cardeal Barreto, “a Igreja não só deve levantar sua voz, mas também expressar a dor e o sofrimento que surge como um grito da Amazônia”.

O cardeal recordou as palavras do Papa Francisco em Puerto Maldonado, onde ele descreveu os povos originários como os guardiães da natureza. “A vida na Amazônia continua sendo um grande desafio, o que nos obriga a todos a uma conversão ecológica, social e cultural, e especialmente a Igreja Católica e outras comunidades de fé”, disse o cardeal. Ele também nos convidou a nos sentirmos corresponsáveis por cuidar da vida e de nossa natureza, e expressou sua esperança de que a Igreja na América Latina e no Caribe seja a voz daqueles que, por várias razões, vivem em meio à dor.

Os jovens, através de Maria José Bolaños López, reconheceram os momentos de graça vividos nos últimos anos, com o Sínodo da Juventude que abriu um espaço para a participação. No entanto, o membro da Equipe Latino-Americana de Pastoral Juvenil pediu mais espaços abertos para os jovens. A jovem mexicana insistiu que “queremos caminhar juntos, com sacerdotes, bispos, cardeais, religiosos, leigos, sendo esta Igreja como um todo e tendo este espírito de sinodalidade”. Recordando as palavras do Papa Francisco, ela reafirmou a riqueza e a criatividade dos jovens, que “sempre têm algo a contribuir para nossa Igreja”.

O Reitor do Seminário Nacional Maior do Paraguai, Padre Cristino Bonhert Bauer, mostrou a realidade da formação dos futuros sacerdotes, destacando a necessidade de uma participação variada, também de leigos e leigas, nestes processos de formação, reconhecendo que não é uma tarefa fácil. Por esta razão, ele enfatizou que “não devemos nos fechar, mas permitir-nos ser ajudados por todos”.

A Igreja tem estado historicamente presente na Amazônia, algo que foi incentivado pela criação da REPAM, que levou toda a Igreja a caminhar junto, e pela celebração do Sínodo para a Amazônia. Os povos indígenas se sentiram acompanhados e pediram à Igreja Católica para ser uma aliada, disse o Cardeal Barreto. O Sínodo para a Amazônia “mostrou a importância dos povos originários para o bioma amazônico e para a humanidade”, segundo o presidente da REPAM, que lembrou alguns passos dados posteriormente, como a criação da Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA).

O cardeal expressou sua esperança de que a Assembleia Eclesial fosse uma caixa de ressonância para todas as angustias do continente. Ele também insistiu nas consequências da economia neoliberal na América Latina e no Caribe, referindo-se às oportunidades perdidas para mudar uma realidade que não leva a colocar a pessoa humana acima de todos os outros princípios, que é o que Jesus faz.

“O povo negro sente que a Igreja não é nossa Mãe, como se fosse nossa madrasta, somos marginalizados, somos excluídos, há muita indiferença por parte dos padres, de muitos bispos, e os missionários que vêm evangelizar o fazem de dentro de si mesmos e não de Cristo”, relatou com dor a Irmã Maria Suyapa. Em seus encontros com as mulheres ela ouve suas queixas: “não somos levadas em consideração, somos excluídas na Igreja e em nossa sociedade”. A religiosa pediu ao Papa Francisco que tomasse uma posição firme em favor do povo negro do continente, como fez com o povo indígena.

Ela insistiu em não ficar calada, contando situações dolorosas, como o padre que “parou a missa porque cantamos a Oração do Senhor em Garifuna”. Isto a levou a insistir na necessidade de que eles fossem evangelizados em nossas culturas. Mas ela também mostrou sinais de esperança, nascidos de um processo sinodal, no qual “estamos sendo incluídos”. Por este motivo, ela ficou grata pela possibilidade de poder participar da Assembleia. Segundo a religiosa, “na medida em que houver conversão, exclusão e discriminação em nossa Igreja, chegará ao fim”.

“Queremos uma Igreja jovem que salve a dignidade humana dos jovens”, disse Maria José Bolaños, denunciando a rejeição e o preconceito que eles sofrem. Segundo ela, “na prática somos deixados de fora, nós jovens precisamos de uma Igreja que aprenda a chorar, a reconhecer a dor para seguir adiante como Igreja e levar essa mensagem e viver nossa fé e os sonhos de Jesus Cristo. Precisamos de uma Igreja que esteja descalça diante dos jovens”. Nas palavras da jovem mexicana, “nós jovens podemos aprender muito, mas também podemos ensinar”, chamando para uma Igreja que acolhe e escuta.

“Não é o melhor momento para o clero”, disse Padre Cristino, apontando os desafios na formação, incluindo a necessidade de os formadores saberem como responder às expectativas dos jovens em relação à sua vocação. A necessidade de considerar diferentes dimensões nestes processos de formação, insistindo na formação a partir de um nível comunitário, a partir de uma espiritualidade realista e comprometida. O presidente da OSLAM destacou a importância de itinerários formativos transversais, com temas diferentes. Nem deixou de lado a questão do abuso, afirmando que “não deveria haver lugar no seminário e na Igreja para pessoas que se aproveitam da Igreja para se tornarem abusadores”.

* Padre Luis Miguel Modino, é assessor de comunicação da CNBB Norte 1

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